- em memória de Zuleika
Fantacini -
Há
muito nossa Batatais tem tradição carnavalesca, Jean de Frans (José Augusto
Fernandes), memorialista notável, já referia, desde o século XIX, o entrudo, as
batalhas de flores, o enterro dos ossos, as mascaradas, o corso e os bailes de
salão.
Rei
Momo, primeiro e único, declara aberta a temporada do carnaval, em oposição ao
tempo da Quaresma, tempo de “tudo pode” como despedida à chegada do “nada pode”
e os súditos fiéis se entregam à folia.
Minhas
primeiras lembranças de carnaval são do começo dos anos 1960, nas matinês do
Clube 14 de Março, domingo e terça-feira a meninada brincava e pulava a todo
gás, as meninas podiam usar um pouco de maquilagem e “pintas” falsas, os meninos
fantasiados, com máscaras de papelão, um pequeno cocar de índio ou apenas de
camiseta e short; saquinhos de confete e
serpentina, martelinhos, buzinas, apitos, os fornecedores eram o Bazar Paulista
(Tonico Tassinari), o Bazar Triunfo (Sebastião “da Pinta”), o armarinho de Dona
Celina Arantes, o João dos Retalhos e outros; nos intervalos era uma luta de quem juntava mais confete do chão ou conseguia
algum rolinho de serpentina pela metade,
se faziam “sanfoninhas” ou se atava à cabeça, à maneira de índio ou de
melindrosa, muitos enrolavam serpentina nos braços, quase múmias de papel.
Alguns
dias antes do carnaval a molecada já estava a postos com serpentinas para
“cercar” os carros; de uma calçada para outra, as crianças espichavam a
serpentina e deixavam-na ir embora à medida que os carros passavam. Outra brincadeira era a “guerra” dos
esguichos, um tipo de bisnaga plástica, variável em tamanho, que se enchia de
água e se atirava aos jatos entre si ou nos carros; quantos e quantos motoristas chegavam a parar
no meio da rua e dar uns berros e correr atrás de nós...cada bronca!
Jânio
Quadros proibiu o lança-perfume em 1961, mas de nada adiantou...muitos anos
depois continuava firme, nas matinês e nos bailes noturnos sempre havia alguém espirrando o perfume geladinho e
até aspirando pela boca ou miturado com bebida, meio às escondidas, parece que importavam da Argentina, fabricada
pela Rhodia, nome comercial de Rodouro em latas douradas, depois de vazias as tais latas viravam pinos de boliche, brincávamos em casa
do João Junqueira e dona Vevinha. Rolava
uma outra versão do lança-perfume, devia ser de uso medicinal, muito mais frágil, quebrava só de olhar, em ampolas de vidro fininho, puro éter e vai
saber o quê mais...
As
matinês eram tão concorridas que muitos “marmanjos” e moças feitas tomavam
crianças pequenas “emprestadas” só para participar da folia da tarde e paquerar
mais um pouco...Nos desfiles de rua as escolas de samba fizeram história a
partir da praça da Matriz, depois na Nove de Julho, dali para a avenida 14 de
Março, depois Moacir de Morais e finalmente o sambódromo Carlos Henrique:
Stela, Princesa Isabel, Castelo, Acadêmicos do Samba, Febem, Riachuelo, Unidos
do Morro, Liberdade, Império; dos blocos
tenho especial lembrança do Bloco do Mé (1980), dos Duros, Regasso, Xaquaiado,
Mocidade Alegre e o meu do coração “Sovaco de Cobra” (1984-86), ao tempo da
Nove de Julho tínhamos um “esquenta” em casa do Dr. Élcio Ricco e Dona Lili, a
linha de partida era ali pertinho, um salve saudoso para os amigos
“sovaquenses” Mário Marcos Abeid,
Cidinha e Denize Bouttelet, Magda Stella, Paulo Amoroso, professor Ferrão, Aurélio Pena,
professor Siena, Vereador Morais, Soninha e Renato Tomazella, Adriana Ricco,
Chico Grilo, Marta Jorge, Kátia Ravagnani, Heloísa Rizzato, Zuca Corsini,
Zuleika Fantacini e Sylvio Maestrelli (Cascatinha) compositor
oficial do bloco, tema Taí Carmen Miranda Imortal, campeão em 1986 (foto).
Um baile de carnaval, entre confete
e serpentina, está na lembrança de muitos amores feitos e desfeitos, dos amores
de final feliz homenageio os queridos amigos Agamenon Geraldo Caldo e Maria
Francisca, em Viradouro, 1970, se conheceram, se apaixonaram num sábado de
carnaval; já a amiga Rosângela Sibin e
José Carlos Oliveira de Freitas ficaram noivos “de aliança” por 1967/68 em
pleno salão da Operária!
E,
claro, curtindo todos os carnavais! Muitos hão de se lembrar: depois de muito
pular e muito brincar e tomar umas e
outras: o que poderia haver de melhor do que “aquela” seleção de sambas e
marchas mais lentas, “aquela” para dançar abraçadinho, rosto colado, do meio do baile para o fim? ansiedade, beijos
roubados, paixões fulminantes, uma vontade que a noite jamais acabasse...”Na
mesma máscara negra, que esconde o teu rosto, eu quero matar a saudade....vou
beijar-te agora, não me leve a mal, hoje é carnaval...”
Jovens adolescentes, a entrada nos
bailes noturnos tinha obrigatoriedade da companhia de um responsável e maior,
além de uma bendita autorização do delegado de polícia, com foto, assinatura
dos pais; lá íamos nós, Carolina Pippa, eu, uma turminha animada escoltados
pela avó D. Carolina Pippa, a moçada “se jogava” no salão do “14 de Março”, no
intervalo corria para a Operária, parava na pracinha da Prefeitura e no Zé Bonitinho para uma drinque ou porradinha (pinga e soda
limonada), o sempre lembrado professor Ronaldo Siena, Rei Momo durante anos
e dono do bordão “..na ponta da passarela”
me contava porres homéricos, casos e anedotas
do carnaval de Batatais
Sempre
achei graça em “Me dá um dinheiro aí”, eterno sucesso de 1959 na voz de Moacir
Franco, só recentemente soube que é uma troça em cima de um mendigo famoso no
Rio de Janeiro que batia a mão na barriga do “freguês” e pedia o
dinheiro...naquele distante ano, a expressão e o gesto viraram
“febre” entre os cariocas. E dá-lhe marchinhas e sambas: Abre Alas, Zé
Pereira, Doce de Côco, Marcha do Pam Pam, Balancê, Fio Maravilha, Pirata da
Perna de Pau, Touradas de Madri, Bandeira Branca, Festa Profana, Explode
Coração, Maria Sapatão, Marcha da Cueca, Teu Cabelo Não Nega, Taí, Chiquita
Bacana, Mamãe eu quero, Pastorinhas, a lista é inesgotável....
Pra
tudo se acabar na quarta-feira.....